Tramita, na Câmara dos Deputados, um Projeto de Lei para ampliar a lista de autoridades que podem classificar informações como sigilosas no âmbito do Executivo Federal. O PL 1333/23, de autoria do deputado Alberto Fraga (PL-DF), busca incluir o diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) entre as autoridades competentes para classificar documentos em grau de sigilo ultrassecreto, hipótese em que uma informação fica com acesso restrito durante 25 anos, renováveis por mais 25.
O texto propõe a alteração do Inciso I do art. 27 da Lei Federal 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação), para adicionar o chefe da Abin ao grupo capaz de classificar documentos como ultrassecretos. A lista atual é composta pelas seguintes autoridades: Presidente da República; Vice-Presidente da República; Ministros de Estado e autoridades com as mesmas prerrogativas; Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica; e Chefes de Missões Diplomáticas e Consulares permanentes no exterior.
A inclusão do diretor-geral da Abin significaria, primeiramente, um enfraquecimento da principal diretriz da Lei de Acesso à Informação: a de que o sigilo deve ser uma exceção. Uma das formas para garantir que essa diretriz seja cumprida é a restrição, em quantidade e em nível hierárquico, de pessoas autorizadas a classificar informações como sigilosas.
Em segundo lugar, a alteração é desnecessária. A Abin é um órgão da Casa Civil da Presidência da República, cujo ocupante máximo já é, como mencionado anteriormente, uma das autoridades habilitadas a classificar documentos e informações como ultrassecretos. Caso haja necessidade da imposição desse tipo de sigilo a algum documento produzido ou armazenado pela Abin, basta que o diretor-geral solicite ou recomende ao titular da Casa Civil – o que, a propósito, é uma prática recomendada, pois a classificação passaria por uma dupla verificação.
Por fim, cabe lembrar que, mesmo sem essa prerrogativa a seu diretor-geral, a Abin é um dos órgãos federais que mais emite negativas de acesso a informações sob a justificativa de sigilo, muitas vezes indevidamente. Em ao menos 64 ocasiões de 2019 a 2022, a agência negou acesso a documentos públicos cujo prazo de classificação já havia encerrado, o que deveria tornar automático o seu fornecimento. Ignorando a interpretação correta da Lei de Acesso à Informação, a Abin utiliza indevidamente o art. 9º-A da Lei Federal 9.883/1999 para criar uma hipótese inconstitucional e ilegal de sigilo eterno. Essa prática já foi questionada em órgãos de controle e judicialmente.
Essa não é a primeira tentativa de permitir à Abin classificar informações em grau ultrassecreto. Em fevereiro de 2019, uma portaria assinada pelo ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, autorizou ao diretor-geral da Abin a classificação em grau ultrassecreto e a outros 11 funcionários da agência a classificação em grau secreto (15 anos). A medida ocorreu após a publicação de decreto, no mês anterior, assinado pelo então vice-presidente, Hamilton Mourão, que permitia aos ministros delegar a tarefa de classificação de sigilo. No entanto, o decreto foi revogado em menos de 40 dias pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
À época, tal revogação não ocorreu sem a pressão da sociedade civil e foi alvo de manifestação conjunta de organizações que atuam em prol da transparência pública no Brasil – incluindo entidades que compõem hoje o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas.
A sociedade civil organizada solicita à Câmara que repita a defesa da Lei de Acesso à Informação que promoveu em 2019, quando aprovou projeto de Decreto Legislativo para suspensão do Decreto Federal 9.690/2019, e que arquive sem demora a nova tentativa de ampliar as possibilidades de restrição de informações públicas.
Créditos da imagem: EBC